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sábado, 24 de agosto de 2013

De estranhos e estrangeiros

Prof. Clóvis F. Ramaiana M. Oliveira


 Original aqui.

Mainha dizia que toda vez que via um jaleco de médico por perto, subia-lhe a pressão. Não era para menos; a velha tabaroa, que falava fluentemente a língua das plantas, via, nos médicos, invasores. Seres que vinham questionar os saberes acumulados nas folhas, nos caules, nas raízes e que circulavam nas melodias das oralidades. Pensava neles de maneira xenófoba.

Lembro sempre dela quando rola o debate sobre os médicos cubanos. Para a velha, bastava usar o jaleco branco.

E para mim?

Vou tentar seguir outros caminhos.

Tenho, na minha família, duas médicas, ambas muito boas no mister que escolheram para suas vidas. Uma delas, minha irmã, sempre foi, como profissional e estudiosa, um dos faróis da minha vida. Também tenho bons amigos que são bons médicos. Um deles, meu cardiologista, me impressiona pela simplicidade e capacidade de sentir, em si, as dores dos seus pacientes. Portanto, nada tenho contra médicos em geral, assim como não tenho contra historiadores, minha profissão. Poderia apontar, nos dois grupos de trabalhadores, práticas degradantes e sujeitos ruins, mas nunca na atividade propriamente.

Por isso gostaria de deslocar meu olhar para outra perspectiva, nunca da qualidade ou não de médicos daqui ou dali.

Quem é, de fato, estrangeiro?

Como um jovem recém-formado em medicina, que sempre morou na capital, cujos pés só pisaram no chão quando foi à praia pode dizer que não estranha o pequeno povoado do Araticum (na também pequena cidade de Serra Preta)? Imagina o que o nosso hipotético formado faria em um fim de semana no Alto do Capim (povoado da Quixabeira)? Estranharia, de certo. Sentiria falta da balada, dos amigos, das luzes alucinadas e olharia aquela "estranha gente" como se visse et's.

Também não gostaria de ver a farmacologia rural: “que conversa é essa de Aroeira ser usada para gastrite”? “Como chá de quebra-pedras’? E que insanidade é essa de curar conjuntivite com banhos de folhas de Cajá”?

Duas línguas, duas gentes.

Formados em grandes cidades, instruídos em faculdades que estão mais próximas da Europa do que do sertão, os nossos doutores (tem uns que exigem o tratamento, tenho que manter) sentem dificuldades em se adaptarem nas distantes e pequenas localidades. Alguns não gostam do cheiro do mato (ouvi uma vez de uma jovem e má médica: “O povo da roça fede”!) e outros falam, com evidente desprezo, da “medicina do interior”.

Pergunto-me: não seriam os nossos médicos os estrangeiros?

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