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segunda-feira, 28 de julho de 2014

As razões do risco da reeleição de Dilma

Aldo Fornazieri

Original aqui.

As últimas rodadas de pesquisa mostram que Dilma ainda lidera, mas que há um risco importante à sua caminhada à reeleição. Ela entrou favorita na campanha, mas com alta rejeição, com queda na avaliação positiva do governo, com crescimento da avaliação negativa, com sério risco das curvas da avaliação positiva e negativa se cruzarem e com viés de baixa nas intenções de voto. É bem verdade que os candidatos de oposição não se moveram significativamente. Mas nas simulações de segundo turno, Dilma tem seu favoritismo cada vez mais ameaçado.

O fato é que, neste momento, existe uma indefinição do eleitorado e o quadro poderá mudar, tanto no sentido de favorecer a reeleição de Dilma, quanto para decretar-lhe a derrota. Tudo depende de como o jogo político será jogado, pois se existem razões que fazem com que o eleitor queria a mudança de governo, também existem razões para que se queira a continuidade do atual governo. É nesse cenário de ambiguidades e paradoxos conjunturais que as estratégias eleitorais terão que navegar e os candidatos terão que se bater. Dada a instabilidade da conjuntura, um erro de avaliação ou de enfoque estratégico poderá colocar tudo a perder.

Não era para ser assim. Todos os presidentes que disputaram a reeleição – Fernando Henrique e Lula – venceram. Cerca de 70% dos candidatos a governador que disputaram a reeleição em 2006 e em 2010, também foram reeleitos. Se a reeleição de Dilma corre riscos é porque ela se situa fora do parâmetro. E as razões dessa ocorrência precisam ser debatidas. Lideranças governistas e petistas estão se mostrando perplexas com a rejeição ao PT e ao governo, principalmente no estado de São Paulo. Existem vária razões que colocam em risco a reeleição da presidente. Aqui serão analisadas três (na verdade duas, nota de Degas) delas.

A Liderança Fraca de Dilma:

Dilma foi eleita em 2010 numa conjuntura que favorecia a eleição de qualquer candidato que representasse a continuidade do governo Lula, pois o eleitorado avaliava como positivo o desempenho de dois mandatos do então presidente. O que garantiu a eleição de Dilma, não foi um amplo reconhecimento de sua liderança popular, pois ela não a tinha. Foi eleita pela força de Lula e pela conjuntura de continuidade. Os governantes que são eleitos pela força das circunstâncias e pela força de outros, e não pela sua liderança própria, sempre terão dificuldades de se firmarem como líderes já que, a rigor, nunca lideraram. Normalmente, o processo de construção de uma liderança demanda tempo, dedicação e qualidades específicas. Desde o governo de prefeito Alceu Colares em Porto Alegre, passando pelo governo de Olívio Dutra no RS e chegando ao governo Lula, Dilma sempre foi um quadro interno e nunca havia disputado uma eleição.

Maquiavel sustentou teoricamente, com base em exemplos históricos, e a história posterior o confirmou, que o governante que acende ao poder, não pelo mérito próprio, mas pela força de outros ou pela sorte, tende a fracassar porque não sabe liderar. A conduta de Dilma na presidência da República mostra que ela não soube aproveitar bem o que a deusa Fortuna e a força dos outros lhe ofereceram. Um governante, um estadista, deve saber agregar, unir e conduzir. Não fará isto com atitudes mandonistas e burocráticas, mas pelo seu prestigio político e moral, pelas suas qualidades e virtudes. Dilma tratou os aliados com desprezo, ignorou os movimentos sociais, ignorou os grupos econômicos e ignorou os partidos políticos. Somente nos últimos meses está correndo atrás do prejuízo, tentando remontar diálogos aqui e ali.

O governante tecnocrata, normalmente, não domina a arte do bem dizer – a retórica. A retórica não pode ser entendida apenas como uma técnica do discurso. Ela deve ser indissociável ao conteúdo político e moral, ao domínio da eloquência enquanto capacidade de convencer o ouvinte e de fazê-lo aderir ao conteúdo e aos valores de quem discursa. Infelizmente, Dilma nunca se apresentou ao público com esse domínio da arte do bem dizer. Não convenceu. Desgraçadamente, o seu marqueteiro ainda tentou encontrar-lhe um lugar de “rainha”, numa manifestação de estupidez política que concebe o cidadão como um ser passivo, súdito do poder. Nos dois últimos anos de mandato, Dilma enfrentou desafios políticos – os protestos de rua e problemas no Congresso – e desafios econômicos, como o baixo crescimento, a inflação etc. Se é no momento da adversidade que o líder precisa mostrar sua capacidade e sua competência, Dilma não soube enfrentar adequadamente esses desafios. Se for reeleita, terá que revelar num segundo mandato a líder que não foi.

Resultados Insatisfatórios e a Corrupção:


O eleitor (o povo) avalia o governante por meio de dois metros: as qualidades do líder e os resultados que ele produz. Os resultados do atual governo também foram insatisfatórios. Tomando como parâmetro os dois mandatos do presidente Lula, o governo Dilma representou um recuo em vários indicadores: inflação, crescimento da economia, nível de geração de emprego, índice de crescimento da renda, investimento produtivo, investimento estrangeiro direto, marcas e programas inovadores de governo etc. Em julho-agosto de 2013, após uma queda brusca na avaliação de seu governo, Dilma não teve a ousadia de trocar sua equipe econômica por outra que fosse capaz de sinalizar novos rumos econômicos ao país. O que se viu de lá para cá é uma lenta e contínua deterioração do ambiente econômico.

Mas nem tudo está perdido: o nível de emprego ainda é alto e a renda ainda está crescendo, embora ambos em níveis menores. As pesquisas de opinião mostram que se há um pessimismo com a situação geral do país, quando a pergunta se dirige à situação pessoal e as perspectivas futuras, as pessoas se mostram otimistas. Este otimismo, certamente, está ligado à renda e ao emprego. Este é um ativo que pode ser trabalhado na campanha de Dilma, mas o seu sucesso vai depender da redução da velocidade da degradação dos indicadores econômicos.

A relação que o povo tem para com a corrupção é complexa e ele costuma reagir de formas diferentes em diferentes situações. Maquiavel tem uma frase lapidar acerca de como o povo se relaciona com os chamados mal feitos. Ele diz que, muitas vezes, “o fato acusa, mas o resultado escusa”. Ou seja, um governante tido como corrupto pode ser perdoado pelo povo desde que ele produza bons resultados no seu governo. Mas o governante (ou partido) tido como corrupto cai em desgraça quando os resultados do governo não satisfazem o povo. Nesses casos, a recuperação e a relegitimação, embora não impossíveis, são muito difíceis. Será preciso um enorme esforço de mudança de discurso e de imagem e de reafirmação dos valores cívicos e morais. Aparentemente, esta é a presente situação do PT e de seus governantes e candidatos. O processo do mensalão passou a imagem de que os líderes petistas se locupletam no poder e  a escassez dos resultados não os escusa, ao menos por uma parte importante do eleitorado – principalmente a classe média.

Aldo Fornazieri – Cientista Político e Professor da Escola de Sociologia e Política.

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