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sábado, 1 de agosto de 2015

O F1 com ventilador atrás

Brabham BT46B: o carro de Fórmula 1 que tinha um ventilador na traseira

Leonardo Contesin
Original aqui.


Depois do Tyrrell de seis rodas, a inovação tirada das brechas do regulamento para obter vantagem sobre as demais equipes foi o efeito solo. Depois de testar durante um ano a aerodinâmica de um carro-asa, a Lotus produziu o 78, o primeiro grande carro de corrida baseado no princípio da asa invertida para obter o efeito solo.

Com esse efeito, o aumento da velocidade do ar sob o carro gera uma queda de pressão, fazendo com que a pressão do ar sobre o carro o empurre para baixo, permitindo ao piloto fazer curvas em velocidades mais altas. Com essa vantagem, a Lotus já havia conseguido quatro vitórias e outros três segundos lugares até a sétima etapa da temporada. Seria difícil reverter a vantagem sem um carro minimamente parecido com o carro-asa de Colin Chapman.


Gordon Murray, da Brabham, foi o primeiro rival a entender a genialidade do Lotus 78 e 79, que conduziram Mario Andretti e Ronnie Peterson a seguidas vitórias, mas ele estava de mãos atadas. Ao contrário do compacto motor Cosworth V8 usado no Lotus, seus Brabham eram equipados com o enorme flat-12 da Alfa Romeo. O motor era potente, e a disposição dos cilindros ajudava a manter mais baixo o centro de gravidade do carro. O problema é que a largura do motor impedia a instalação de sidepods em formato de asa invertidas nas laterais do carro — um problema que inviabiliza a adoção de efeito solo, uma vez que é essencial obter fluxo de ar limpo e sem interrupções.

Mas Gordon Murray, pensando diferente como sempre, chegou a uma solução brilhante: já que não podia reduzir a pressão sob o carro com o fluxo de ar, ele aproveitou uma ideia usada pela primeira vez por Jim Hall em seu Chaparral 2J de 1970: usar exaustores para tirar o ar da parte de baixo. O problema é que os dois exaustores do Chaparral eram movidos por um motor extra, vindo de um snowmobile — uma ideia inviável para a Fórmula 1 devido ao peso extra e complexidade.

Murray então simplificou e adicionou leveza — com a ajuda de uma brecha no regulamento: instalou um único exaustor gigante, conectado por engrenagens ao drivetrain do carro — uma solução mais simples e que trazia um efeito colateral positivo: quanto maior a aceleração, maior o efeito solo. Na época o regulamento proibia o uso de aparatos aerodinâmicos móveis, então Murray instalou o exaustor com o argumento de que ele servia para arrefecimento do motor, e selou o compartimento do motor para que o exaustor gerasse pressão negativa sob o carro.

O carro estreou no GP da Suécia de 1978, com Niki Lauda e John Watson ao volante de cada exemplar. Antes mesmo da corrida começar os rivais protestaram a legalidade do carro (que tinha uma tampa de lixeira cobrindo o ventilador!), mas os comissários rejeitaram as reclamações e o grid foi formado normalmente.

Watson largou da segunda posição, ao lado de Andretti. Lauda veio atrás, em terceiro, ao lado de Ronnie Peterson com o outro Lotus. Logo na largada Lauda passou Watson e colou em Andretti. Ricardo Patrese, que largara em quinto, assumiu a quarta posição, pressionando Watson.

No fim da segunda volta Patrese passou Watson para assumir o terceiro lugar. Depois foi a vez de Peterson passar Watson e, mais tarde, Patrese, mas na volta seguinte o sueco teve um pneu furado e acabou ficando para trás. Em seguida, foi a vez de Watson abandonar com um problema no acelerador. Enquanto Patrese corria para garantir seu terceiro lugar, Andretti e Lauda brigavam pela vitória mais à frente. Na volta 38 Andretti cometeu um erro e o austríaco o ultrapassou por fora em uma curva. Mais tarde Andretti abandonou com uma válvula quebrada. Lauda terminou a prova em primeiro, com uma vantagem de 34 segundos sobre Patrese e 34,1 segundos sobre Ronnie Peterson.

Em sua biografia “To Hell and Back”, Lauda conta que em certa altura da corrida, um dos retardatários espalhou óleo na pista e, enquanto os rivais precisavam reduzir a velocidade sobre o óleo derramado, os Brabham simplesmente aceleravam, pois o exaustor mantinha o carro pressionado pelo efeito solo. Andretti, que ficou atrás do BT46 por oito voltas disse que “o carro parecia um maldito aspirador de pó gigante. Ele joga sujeira demais na sua cara”. Murray, por sua vez se defendeu: “O exaustor não pode atirar nada para trás, por que o fluxo de saída é de apenas 80 km/h”.

Novamente houve protesto dos rivais — embora a Lotus já tivesse começado a fazer um projeto idêntico para o Lotus 79, mas o carro estava dentro do regulamento. O problema é que Bernie Ecclestone, então dono da Brabham, havia acabado de se tornar presidente da associação de construtores da F1 (FOCA) e negociou um acordo com os demais construtores segundo o qual correria outras três corridas antes de aposentar o carro. Contudo, talvez já de olho em assumir o controle do circo futuramente — situação na qual precisaria do apoio unânime dos construtores — Bernie decidiu não entrar em confronto e tirou o carro da competição.

Assim, o Brabham BT46B nunca mais entrou na pista e tornou-se o único carro com 100% de aproveitamento na história da Fórmula 1. Sem esse rival de peso, Andretti continuou dominando a temporada com seu Lotus 79 e conquistou o título de pilotos e construtores com 28 pontos de vantagem sobre a Ferrari, a segunda colocada.

Um comentário:

  1. Não participou em provas oficiais, mas Nelson Piquet participou do Gunnar Nilsson Memorial Trophy em Silverstone 1979 com ele. O carro usado foi o # BT46/4, o mesmo que John Watson utilizou na corrida em Anderstorp.

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