Numa recente entrevista à Folha (leia aqui), o inventor e pesquisador americano Ray Kurzweil, afirma que "as máquinas vão imitar indistinguivelmente o comportamento de uma pessoa". Mais audacioso, Kurzweil marcou a data em que isto acontecerá: precisamente no ano de 2039.
Ray Kurzweil prevê máquinas indistinguíveis dos humanos em 2039 |
Apesar de ser previsor com acerto de alguns eventos, como a explosão da quantidade de usuários da Internet quando esta ainda contava com menos de 2000 pontos de acesso, desta feita parece temeroso apostar alto nas previsões de Kurzweil. Primeiro, porque não sabemos exatamente qual a sua contabilidade de previsões certas e erradas, já que apenas seus acertos ficaram famosos. O segundo, e principal argumento, é que essas previsões a respeito da evolução da tecnologia com frequencia revelam-se excessivamente otimistas: por exemplo, aos olhos das pessoas dos anos 60 do século passado, nós hoje estaríamos visitando corriqueiramente a órbita de Júpiter, e colonizando suas luas.
Todavia, ocorre que a previsão de Kurzweil esbarra em limites muito mais, digamos, prosaicos. Não obstante, bastantes relevantes do ponto de vista da Ciência da Computação. O cientista americano aponta a iminência de copiarmos o modelo do sistema neuronal humano, e criar uma máquina que supere os (segundo ele mesmo) 300 milhões de reconhecedores de padrão que possuímos. Todavia, a criação deste hardware biônico não encerra o problema. Muito pelo contrário. É que ainda restará em aberto o problema em si, que é imitar indistinguivelmente o comportamento humano. Este problema, proposto nos anos 1950, é conhecido como Teste de Turing (aqui) e, até o momento, não há algoritmo conhecido que o resolva satisfatoriamente.
Além da limitação imposta pelo Teste de Turing, ainda há um obstáculo potencial - e instransponível - que pode ser encontrado nesta caminhada. Existem problemas, como o famoso Problema da Parada (aqui), que são comprovadamente insolúveis por qualquer Máquina de Turing, que são o modelo matemático definitivo para os computadores. Não há nenhuma garantia de que, ao caminharmos na direção preconizada por Kurzweil, não nos depararemos com problemas assim.
Portanto pode ocorrer de não conseguirmos resolver o Teste de Turing, e assim jamais implementarmos a máquina que Kurzweil propõe que esteja pronta em 2039. E pode também ocorrer que, ao tentarmos resolvê-lo, esbarremos em um problema que efetivamente não pode ser tratado pelos computadores. Neste caso, seria necessário reinventar o computador tal como o conhecemos para continuar tentando.
Tudo isso depõe um pouco contra as previsões de Ray, mas não encerra a questão.
Há uma especulação a respeito do fim da Lei de Moore (aqui): podemos chegar a um cenário em que não será mais possível avançar na capacidade de processamento das máquinas usando um único processador. Caso isso se verifique, e parece mesmo que se verificará a se ver que a evolução da velocidade dos processadores é cada vez mais lenta, então o aumento da capacidade de processamento e a miniaturização dos dispositivos podem se tornar mutuamente incompatíveis. Um fato desencorajador frente às pesquisas em áreas como reconhecimento de linguagem natural que propõem algoritmos que demandam capacidade de processamento cada vez maior.
Assim, por mais que seja bela ou amedrontadora a realidade prevista por Ray Kurzweil, parece improvável que isso se dê tão cedo, se for o caso.
Mas afirmar isto também é um exercício de futurologia. Pode se mostrar uma grande bobagem.
Quem viver, verá.
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