Engraçado como as reações da imprensa frente à hipotética – e jamais admitida sequer por ele mesmo – mudança constitucional que permitiria um terceiro mandato para o presidente Lula foram firmes, duras. Os termos usados variaram de “casuísmo” a “oportunismo” e, mesmo, “golpe”.
Da mesma forma, a frustrada tentativa de Hugo Chávez na Venezuela ganhou as primeiras páginas dos jornais, com direito a uma gafe histórica do “Estadão” (leia aqui). Chávez depois acabaria logrando êxito em sua tentativa.
De fato, pessoalmente me parece que agem mal os presidentes que, estando no exercício de um mandato para o qual foram eleitos, sejam beneficiados por mudanças constitucionais que modifiquem as regras no decorrer do próprio mandato. Corre-se o sério risco de viciar o processo pelos interesses – nada desprezíveis – dos mandatários. Não se deve permitir isso. Mudanças de regras só podem beneficiar mandatários futuros, jamais os vigentes.
Assim, Lula não poderia, como não pleiteia, ter um terceiro mandato. Chávez não deveria ter obtido o direito. Nesse sentido, agiu muito bem a imprensa em denunciar, e expor esse abuso de poder a todo o planeta. Chávez abusou do poder presidencial.
Ocorre que Fernando Henrique Cardoso, nosso ex-presidente, agiu da mesma forma, e a postura da grande imprensa não foi assim tão veemente. Algumas críticas aqui e ali, legadas aos rodapés das páginas dos principais jornais. Ontem, de maneira semelhante, Álvaro Uribe, presidente da Colômbia, aprovou um referendo para decidir pelo seu terceiro mandato (leia aqui), também sem maiores críticas de nenhum grande jornal ou rede de televisão.
Quando Chávez aprovou um referendo similar, viu-se o estardalhaço na imprensa. Na Rede Globo, por exemplo, Alexandre Garcia chegou a dizer que “Chávez poderá se reeleger quantas vezes quiser”. Não obstante, pouco – às vezes nenhum – espaço é dado à ação igualmente oportunista de Uribe na Colômbia.
O que nos faz pensar num padrão: um terceiro mandato para Lula, ou o referendo para reeleição de Chávez vão para as manchetes como “escândalo” e “golpes contra a democracia”. Já a emenda da reeleição de Fernando Henrique Cardoso, ou o referendo para reeleição de Álvaro Uribe são manobras políticas polêmicas, mas apenas frutos da conjuntura política.
Será que podemos confiar nos critérios das análises que lemos na imprensa?
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