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quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Ciência(?) da Computação

Deixa eu monologar um pouco sobre esse assunto, provocado que tenho sido já há tanto tempo: computação é ciência?

Tenho até algumas discussões acaloradas arquivadas em minha memória sobre isso; a imensa maioria delas com pessoas de ciências humanas que, invariavelmente, apontavam a Computação como uma "Engenharia" e estas como não sendo ciência.

Em primeiro lugar, é importante esclarecer que esse elitismo é sem sentido: não há a mínima vantagem, do ponto de vista prático, em ser classificada ou não como "ciência" segundo qualquer parâmetro. Mesmo as instituições de fomento tratam de tornar essa discussão menos relevante ao conceder financiamentos a programas de "ciência e tecnologia" indiscriminadamente. Fim da briga.

Mas em seguida ocorre o argumento que é apresentado para depor as engenharias do patamar de "Ciência": o engenheiro é detentor de um conhecimento técnico aprofundado, e atua como elemento de transformação, erigindo alguma coisa (o “engenho”) que seja do interesse das pessoas.

Com efeito, imaginar uma pessoa que possui um conhecimento e o utilize para engenhar (daí o nome engenharia) alguma coisa não é realmente ciência. Engenheiros não são cientistas. Mas, curiosamente, um pedagogo é detentor de conhecimento e o utiliza para engenhar coisas. O seu engenho são projetos pedagógicos, planos de ensino, currículos acadêmicos, etc. Um médico também engenha um diagnóstico, tratamento. Um psicólogo, um sociólogo, um biólogo. Todos costumam atuar construindo, engenhando, coisas. Por acaso não seriam a Pedagogia, a Medicina, a Psicologia, a Sociologia e a Biologia exemplares do "seleto" universo das ciências?

Entende-se ciência como "Um corpo formal e consistente de conhecimento sobre objeto bem definido" (Popper). Essa definição é muito criticada, pois o "formal" e o "consistente" é altamente questionável. Do ponto de vista de um físico, por exemplo, nada (ou quase nada) há de formal no conhecimento da Sociologia.

Bacon, e depois Popper, apontam que o avanço da ciência só pode se dar como resultado da hipótese submetida a experimentos, gerando afirmações falsificáveis. A submissão de uma hipótese, cujas premissas precisam ser conhecimento consolidado, a experimentos reprodutíveis que geram resultados é o que, grosseiramente, se chama "Método Científico".

Mas aqui também ficamos a ver navios... como falsificar teorias sociológicas ou históricas? E como experimentá-las, lembrando que os experimentos precisam ser "reprodutíveis"? A própria Teoria da Evolução, de Charles Darwin, é um conhecimento aceito e aplaudido não por ser experimentável; apenas por ser "do bom senso". É o tipo de pensamento que diz assim: é desse jeito, não há dúvidas, apenas porque nenhuma outra explicação é tão razoável e simples quanto essa. Invoca a Navalha de Occam.

Essa concepção não admitiria pensamentos dialéticos como resultados válidos da ciência. O fato de, em economia, inúmeras teorias simplesmente coexistirem não poderia ser possível, a princípio. Apenas uma delas não iria "falhar" frente a um experimento, e provar-se falsa. O pensamento científico de Popper precisou ser "extendido" por Foucault e outros, para abrigar, entre outras, a maior parte das ciências humanas.

É difícil, portanto, chegar a um consenso sobre o que é ciência, afinal de contas.

Tomemos de novo o exemplo acima, confirmando que de fato um engenheiro não é um cientista. Ele é um tecnólogo, que detém um conhecimento e o utiliza para gerar algo novo, e útil. O mesmo se dá para um pedagogo, que produz (ou reproduz) o processo educacional para as pessoas, ou para um médico, num diagnóstico e prognóstico, ou para um biólogo, etc.

E, claro, um "computeiro" que esteja projetando o cabeamento e a rede de uma corporação, ou desenvolvendo um sistema de informações, também não é um cientista. É um tecnólogo.

Mas tomando a engenharia como exemplo, particularmente a engenharia civil, e fazendo uma breve visita à História, podemos constatar que, de fato, segue-se todo o rigor do método científico para que a técnica possa evoluir. Isso a caracteriza, de fato, como uma ciência. Pelo menos segundo Bacon e Popper. Senão vejamos.

Olhando para uma construção do início do século passado, uma "obra d'arte" (pontes, túneis, etc.), veremos que se utilizava técnicas que hoje não são mais empregadas. O metrô de Londres, Moscou ou Paris são quase totalmente subterrâneos; o de Tóquio tem muito de sua estrutura externa, em obras elevadas. Hoje eles são feitos assim mesmo. Porque houve a mudança?

O que ocorreu é que novas alternativas para construção de obras dessa natureza foram sendo apresentadas ao longo do tempo, permitindo que a técnica evoluísse. Materiais que são empregados, estruturas geométricas, organização de trabalho, etc. mudaram. E não evoluíram aleatoriamente, mas segundo uma orientação rigorosa, com levantamento de hipóteses, experimentação, teorização.

Para se fazer pontes da forma que se faz hoje, uma série de hipóteses foram testadas, experimentadas, e daí se tira uma conclusão, validando ou refutando. E esta afirmação é falsificável, pois pode-se fazer experimentos a respeito (e aí a ponte pode cair!). Esse processo de evolução da técnica é, efetivamente, o método científico sendo posto à prova (há considerações sobre a validade do método científico em si, mas vou ater-me por ora). Não fica em nada a dever à definição de ciência proposta por Carl Popper. Não se pode, portanto, negar à engenharia o status de ciência. Aliás, é precisamente por esse motivo que hoje se produz engenhos que não eram possíveis outrora, ou eram a custos maiores, ou em mais tempo.

A engenharia aeronáutica, genética e de materiais são exemplos muito claros de corpos de conhecimento semelhantes e, certamente, qualquer engenharia pode ser encaixada nesse universo; um corpo de conhecimento, uma hipótese, o método científico, a validação/refutação da hipótese, o corpo de conhecimento evolui.

E a computação também se encaixa aí, mesmo se for vista apenas como uma engenharia, o que é uma maneira extremamente limitada e simplória de compreendê-la; cada melhoria no processo de produção de um artefato computacional, cada ampliação do horizonte de coisas computáveis, cada resultado registrado do ponto de vista da complexidade, é resultado de um processo rigorosamente científico, partindo de um corpo consolidado de conhecimento, tecendo uma hipótese, gerando experimento reprodutível (tipicamente programas... e como alguns são fáceis de reproduzir, via pirataria, não?), e validando/refutando a hipótese considerada.

A Computação, porém, assim como a Matemática, possui uma vertente de considerações puramente filosóficas, onde podemos fazer comparações com organismos vivos, e com fenômenos como inteligência, linguagem, evolução (não estou falando de paradigmas computacionais, mas da correlação da Computação com fenômenos biológicos e naturais), na tentativa de interpretar até que ponto a computação efetivamente modela, ou mesmo reproduz, fenômenos dessa natureza. Essa fronteira é menos explorada, e naturalmente carece de mais fundamentação científica. Não há teoria nem experimentação suficiente para isso. Não há, provavelmente, nenhum conhecimento científico. Ainda.

Mas há pensamento.

Filosofia.

3 comentários:

  1. Idiotas tecnológicos. É o que são voces. Não fazem a mais mínima idéia do que seja Ciência. Do que seja método científico. Do que seja Teoria da Ciência.

    Servem para tecnologia. Tecnólogos. Essa é a cruel diferença.

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  2. o cara que fez o comentário acima é uma virgem de 40 anos.

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  3. Por que o anonimato?
    Tem medo/vergonha de suas próprias idéias?

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