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terça-feira, 14 de julho de 2009

Pirataria

O problema da Pirataria é um dos quais todos os dirigentes do Brasil, em todos os níveis de poder, fogem. Claro que a pirataria impede a geração de empregos formais. Claro que a pirataria desestimula empresários nos mais diversos setores. Claro que a pirataria diminui a arrecadação dos estados e municípios, bem como da União. Mas ainda assim os governantes literalmente temem lidar com a pirataria. Fogem disso tanto quanto o demônio foge da cruz.

Longe de justificar, é, porém, muito fácil entender os motivos. Basta vermos que a Pirataria é fruto de uma série de fatores.

O primeiro deles é a facilidade. Dúzias de navios abarrotados de produtos piratas saem todos os dias dos países que os produzem (quase oficialmente). A oferta é quase infinita. A rede de distribuição, hoje, supera a de qualquer rede de varejo do planeta.

O segundo é o custo. Os produtos piratas entram no mercado brasileiro normalmente via contrabando. Isso os isenta de impostos. Além disso, a qualidade final dos produtos é, digamos, mais flexível. O que permite produzi-los com uso de material, processos e mão de obra de nível inferior. Dessa forma, o produto pirata é financeiramente muito mais competitivo.

O terceiro fator é a condição sócio-econômica da população. A imensa maioria das pessoas que trabalham “na ponta”, ou seja, vendendo os produtos piratas aos consumidores, atuam como camelôs. Normalmente sem direito a férias, assistência e previdência social, aposentadoria. Seguramente longe da condição ideal. Logo, são pessoas que não encontram muitas alternativas atraentes para substituir essa atividade. Não se sabe o que fazer com eles, caso sejam impossibilitados de continuar vendendo seus produtos. Em cidades como Ilhéus, onde a economia derrete a olhos vistos, esse fator ganha contornos particularmente dramáticos. O comércio pirata é muito maior do que o comércio formal. Por exemplo, onde se adquire DVDs e CDs originais na cidade? Já procurei e não encontrei. As opções são o Bompreço e as Americanas em Itabuna. Ou os sites na Internet (normalmente é mais barato).

O último fator é a atuação da Justiça. Sendo uma atividade ilegal, espera-se uma ação efetiva da polícia na repressão, e da Justiça na sanção. Tal, porém, não se dá.

Entretanto, é extremamente complicado se tomar qualquer ação governamental realmente efetiva contra a pirataria. Porque não dá para tratar todas as atividades piratas da mesma maneira, tampouco as pessoas que trabalham nisso. Porque não podemos controlar os aspectos do marketing desses produtos. Porque não podemos ser insensíveis aos aspectos sociais. Porque a capacidade de ação do estado não é suficiente.

Uma coisa de cada vez.

Não é possível que consideremos a nocividade de todos os produtos piratas como um mal comum, indistinguível. Obviamente o comércio de CD pirata é ruim. O de DVD pirata também. Mas pessoas comprando remédio pirata é muito pior. O mercado de produtos piratas é extremamente diversificado. Passa por cosméticos, roupas, calçados, produtos químicos, combustíveis e até peças para automóveis e (impressionante!) aviões. Nesse caso, justifica-se o fato de a Polícia eleger certas prioridades no seu combate, posto que não há como atuar contra toda a indústria dos piratas. E aí ouçamos a voz da razão ao responder: qual deveria ser a prioridade? Quem escolheria combater mais efetivamente os DVDs piratas do que, por exemplo, antibióticos piratas?

Também não é possível controlar o marketing dos produtos: consideremos os famosos 4P (product, price, placement, promotion). Além de "alugar" marcas alheias, usufruindo de seus investimentos em promoção (promotion) e produto (product), o marketing da indústria da pirataria é perfeito nos outros dois: distribuição (placement) e preço (price). Pode-se encontrar produtos piratas em quase todas as esquinas do Brasil. Além disso, eles são produzidos, normalmente no exterior, a custo baixíssimo, e ainda não pagam impostos. A indústria pirata aposta na lógica pura e simples do capitalismo: os consumidores (como todas as outras pessoas) sempre desejarão conseguir o máximo possível de vantagem nas transações financeiras. Portanto, os produtos Piratas sempre serão atraentes para as pessoas. E podem ser adquiridos na esquina mais próxima. Isso se dá principalmente no caso de produtos onde há pouca ou nenhuma diferença (perceptível pelo consumidor) de qualidade, como é o caso de CDs e DVDs. Dessa forma, sempre haverá demanda comercial e, por esse motivo, também existirão pessoas se esmerando para atendê-la e lucrar com isso. A indústria da Pirataria é alicerçada numa estrutura de marketing muito sólida.

Da mesma forma, não podemos tratar os camelôs que atuam no comércio informal vendendo produtos piratas da mesma forma que os distribuidores e os produtores. Evidentemente há uma grande diferença. Sendo, entre outras coisas, resultado da própria condição sócio-econômica do Brasil, é fácil ver, na indústria da pirataria, que o vendedor é muito mais vítima do que réu. Impedi-lo de vender CDs e DVDs piratas hoje, sem que lhe seja oferecida uma alternativa, além de ser um ato de injustiça social, provavelmente o levará a buscar alternativas em atividades ainda piores. O tráfico de drogas, por exemplo, recruta pessoas a todo instante. Os índices de criminalidade não param de crescer. Combatendo o camelô de produtos piratas corremos o risco de trocar um pequeno mal por um mal maior.

Finalmente, a constatação mais dura: não há força policial no mundo que seja capaz de coibir satisfatoriamente a comercialização dos piratas. Porque o investimento que os estados teriam que fazer na polícia a fim de habilitá-la a essa missão supera, e muito, a capacidade financeira de qualquer estado do planeta hoje. Simples assim.

Dessa forma, por qualquer que seja o ângulo de análise, do ponto de vista da administração pública o combate à pirataria é uma guerra perdida. Qualquer governante sabe disso. Simplesmente não há alternativas senão em médio e longo prazo.

No futuro. Se o construírmos hoje.

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