O caso do presidente Sarney (presidente do senado) é um caso emblemático de ação expiatória da grande imprensa brasileira: decidiu-se que Sarney deixará a presidência, e toda a artilharia de todos os órgãos de imprensa estão fortemente empenhados nisso.
Não que o senador do Amapá, embora maranhense, seja desmerecedor de tal deferência. Os atos secretos, as nomeações de parentes e agregados, as verbas mal explicadas, tudo isso é motivo não só para o afastamento, também a cassação, quiçá ajustes junto ao poder judiciário deveriam ser cogitados.
Motivo ético, bem entendido. Porque, infelizmente, do ponto de vista legal, aparentemente, nada pode ser feito. Havia ou há, e isso é talvez o maior absurdo nessa história toda, respaldo em Lei para todas essas ações tomadas pelo Sarney, bem como por todos os presidentes que o antecederam.
O caso, porém, é que a imprensa está usando dois pesos e duas medidas: senadores como Heráclito Fortes (DEM/PI) e Arthur Virgílio (PSDB/AM), entre muitos mais, também foram surpreendidos com “a boca na botija”, exercendo o mesmo tipo de interferência de que o presidente Sarney é culpado: nomeação de cargos para favorecidos, uso não satisfatoriamente explicado de verbas, etc. Apesar de denunciados pelos órgãos de imprensa, esses dois senadores (e muitos outros mais) rapidamente deixaram os holofotes e não estão diariamente em todas as capas de todos os jornais, nem nas manchetes de aberturas dos telejornais, nem na janela inicial dos sites de notícia.
Do ponto de vista político, o jogo é muito claro: como Sarney é de um partido aliado do governo, recebe apoio do Planalto. Pelo mesmo motivo, recebe fogo cerrado da oposição, que ainda tem um interesse a mais nesse episódio, já que o vice de Sarney é o senador Marconi Perillo, do PSDB de Goiás. Não se pode desprezar a presidência do senado. Além disso, temendo a repercussão das manchetes na opinião pública, Sarney também é alvo de “Fogo amigo”, seja de partidos aliados, como o PT, seja de co-partidários seus, no PMDB, como os senadores Pedro Simon(PMDB/RS) e Jarbas Vasconcelos (PMDB/PE).
Não obstante, a postura da imprensa permanece difícil de explicar. Porque os demais senadores que foram “surpreendidos” em atos similares são, no mínimo, tão culpados quanto o presidente da casa. Os atos de Sarney, apesar de estarem mais à mostra, inclusive com gravações de conversas telefônicas, definitivamente não são piores que os de outros tantos senadores. Se aquele não pode permanecer na presidência, estes por sua vez não possuem autoridade para julgar.
Todavia, independente de explicações, e despreocupada com a cobertura mais técnica do ponto de vista jornalístico, a imprensa certamente seguirá mantendo fogo cerrado sobre Sarney.
Só que, para surpresa de alguns, talvez a derrocada do presidente simplesmente não aconteça: o poder da mídia hoje seguramente é menor do que já foi outrora. Manterão a artilharia em intensa atividade sobre seu alvo, até que ele seja destruído.
Mas a munição pode acabar antes.
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